Aposta de Trump em tarifaço impõe risco político e ameaça popularidade do presidente; entenda

Pesquisas mostram que consumidores estão menos confiantes na economia, enquanto eleitores reprovam tarifas de olho na inflação. EUA terão eleições legislativas em 2026.
"Dia da Libertação". O presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, usou essa expressão para anunciar uma série de tarifas recíprocas contra mais de 180 países e territórios ao redor do mundo na quarta-feira (3). Internamente, no entanto, especialistas acreditam que a medida pode causar um revés político para o presidente.
▶️ Contexto: Trump anunciou tarifas que variam de 10% a 50% sobre produtos importados pelos EUA de diversos países. O objetivo é estimular a indústria americana e favorecer produtos nacionais.
- Por outro lado, especialistas alertam que levará anos para revitalizar a manufatura nos EUA, alterar cadeias de suprimentos e trazer a produção de volta ao país.
- Enquanto isso não acontece, os preços podem subir, pressionando a inflação e desacelerando a economia.
- Trump chamou esses possíveis efeitos de "perturbação", sugerindo que seriam problemas temporários.
- No entanto, no curto prazo, os eleitores podem não estar dispostos a aceitar essas condições.
"Agora é a nossa vez de prosperar e, ao fazer isso, usar trilhões e trilhões de dólares para reduzir nossos impostos e pagar nossa dívida nacional, e tudo isso acontecerá muito rapidamente", disse Trump.
👀 Eleições à vista: Em 2026, os eleitores dos Estados Unidos irão às urnas para renovar a Câmara dos Representantes e parte do Senado.
- Atualmente, os republicanos de Trump controlam ambas as casas do Congresso por margens estreitas.
- Caso os impactos econômicos das tarifas desagradem os eleitores, os democratas podem recuperar o controle de uma ou ambas as casas.
- "Ele (Trump) tem uma alta tolerância à dor, mas isso pode se transformar em uma dor real nas urnas em novembro de 2026", disse Mike Dubke, ex-diretor de comunicação do presidente em seu primeiro mandato.
"A preocupação aqui é: em que momento veremos os benefícios que ele e seus assessores acreditam que colheremos? Porque ele só tem 18 meses antes das eleições legislativas."
👎 Medida reprovada: Uma pesquisa da Reuters/Ipsos mostra que 70% dos americanos, incluindo 62% dos republicanos, acreditam que o aumento das tarifas fará subir os preços dos alimentos e outros bens de consumo.
- Cerca de 53% dos entrevistados concordam que a medida causará mais danos do que benefícios, enquanto 31% discordam. O restante não soube responder.
- Apenas 31% acreditam que os trabalhadores americanos sairão ganhando com as tarifas, enquanto 48% discordam.
- Uma média de pesquisas sobre o governo Trump, calculada pelo estatístico Nate Silver, aponta que a reprovação do presidente atingiu 49,9% em 3 de abril, enquanto 46,6% dos americanos o aprovam.
- "O principal risco é para a economia", disse Lanhee Chen, pesquisador da Hoover Institution e ex-assessor dos republicanos Mitt Romney e Marco Rubio.
- Chen lembra ainda que um dos motivos que levou Trump à Casa Branca foi a promessa de reduzir o custo de vida dos americanos. Os números da inflação prejudicaram o desempenho da candidata democrata, Kamala Harris, na última eleição.
- Pesquisas sobre a confiança das famílias e das empresas na economia apresentaram queda acentuada nos últimos dois meses, após Trump intensificar o discurso sobre tarifas.
↩️ Outros efeitos: O anúncio das tarifas fez os futuros do mercado de ações dos EUA despencarem. No Brasil, o dólar fechou em forte queda, atingindo o menor valor desde outubro.
Sinais de insatisfação com Trump começaram a aparecer entre os republicanos. Analistas acreditam que alguns efeitos já foram sentidos em duas eleições recentes, realizadas na terça-feira (1º).
- Na Flórida, candidatos republicanos venceram duas eleições especiais, mas por margens muito menores do que Trump obteve no estado no ano passado.
- Em Wisconsin, um estado decisivo que Trump venceu em 2024, uma candidata liberal conquistou um assento na Suprema Corte estadual. A vitória representou um revés para Trump e para o bilionário Elon Musk, que apoiou financeiramente o candidato conservador derrotado.
Enquanto isso, o Senado dos EUA aprovou na quarta-feira uma legislação para eliminar novas tarifas sobre o Canadá, com uma votação de 51 a 48. A medida, patrocinada pela oposição, contou com o apoio de quatro republicanos e ainda será discutida na Câmara.
🔎 Análise: Especialistas divergem sobre os efeitos das tarifas no longo prazo.
- Para Philip Luck, diretor do programa de economia do Centro de Estudos Estratégicos e Internacionais, há risco de retaliação por parte dos parceiros comerciais dos EUA.
- "Do ponto de vista do risco político, essa é uma ideia muito ruim", afirmou.
- Por outro lado, Barbara Trish, professora de ciência política no Grinnell College, em Iowa, disse que Trump já conseguiu escapar de críticas mais profundas.
- "Quantas vezes os analistas já pensaram legitimamente: 'Ok, agora ele foi longe demais, o Teflon vai rachar', e isso não aconteceu?", questionou.
🛍️ Proprietários de pequenos negócios também fazem avaliações mistas:
- Em Baltimore, uma cidade historicamente democrata, Drew Greenblatt, dono de uma empresa de produtos de metal, disse que as tarifas de Trump estavam ajudando a aumentar os pedidos por produtos nacionais.
- Já em Washington, D.C., Michelle Lim Warner, proprietária de uma loja de vinhos, afirmou estar mais pessimista, já que dois terços dos produtos que vende são europeus: "Quem vai pagar US$ 75 por uma garrafa de vinho que antes custava US$ 25?", questionou.
