Na era dos smartphones, radioamadorismo volta a ganhar força no Paraná

Número de radioamadores voltou a crescer, mostram dados da Anatel. Mais do que um hobby, pode ser também uma salvaguarda.
Num tempo em que celular era coisa de ficção científica e a televisão e o telefone fixo artigos de luxo, uma das principais formas de se comunicar era através do rádio. Mas hoje, na era dos smartphones e das redes sociais, um dado curioso: o radioamadorismo voltou a ganhar força no Paraná. E isso é mais um motivo para se celebrar o dia 5 de novembro, que marca o Dia do Radioamador Brasileiro.
De acordo com dados da Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel), no final de 2020 o Paraná somava cerca de 2,1 mil pessoas (naturais e jurídicas) autorizadas a explorar o Serviço de Radioamador. Hoje, já são mais de 3,3 mil praticantes do hobby, dos quais 1,1 mil estão em Curitiba.
Mas afinal, você sabe o que é o radioamadorismo?
Pela definição oficial, da Anatel, trata-se de um serviço de telecomunicações de interesse restrito, destinado ao treinamento próprio, intercomunicação e investigações técnicas, levadas a efeito por amadores, devidamente autorizados, interessados na radiotécnica unicamente a título pessoal e que não visem qualquer objetivo pecuniário ou comercial.
Já Fábio de Oliveira Converso, supervisor geral da REER (Rede Estadual de Emergência de Radiomadores), destaca que o radioamadorismo é, antes de tudo, um hobby.
"Ele tem o seu primórdio na hora da experimentação, da eletricidade, do eletromagnetismo, que foi ali no final do século XIX. Tivemos as experiências do padre Landell de Moura, que foi na mesma época do [Guglielmo] Marconi, o italiano que teve a patente lá nos Estados Unidos. E ali o primórdio foi uma transmissão, como se fosse uma transmissão de código Morse. Posteriormente teve as primeiras transmissões de voz e isso começou a gerar curiosidade entre as pessoas que tinham acesso a esses equipamentos. Foi uma coisa que acabou se propagando", explica Converso.
Além de um hobbysta, no entanto, o radioamador é um experimentador, ressalta ainda o supervisor da REER. "Se a gente olhar hoje o celular que a gente segura na mão, ele teve um primórdio no experimento de radioamador. Você tem um rádio, tem uma repetidora e o princípio do celular é o mesmo. Entre outras tecnologias também, como o micro-ondas. Por quê? Muitas vezes, esse experimentador, esse cientista, ele também era radioamador."
A retomada do radioamadorismo
Para os mais jovens pode ser difícil de imaginar um mundo sem smartphones e internet. Mas até meados de 1997 sequer existia celular e nem todos na população brasileira tinham acesso ao telefone fixo, que era coisa para os privilegiados. Em decorrência do alto custo da linha telefônica, então, muitos recorriam a meios alternativos para se comunicar, como o rádio. E isso era uma coisa que acabava fomentando naturalmente o radioamadorismo.
Com o advento da telefonia celular, no entanto, o hobby começou a perder força. Um movimento que se intensificou a partir do surgimento dos smartphones, especialmente. "Hoje você tem num desses aparelhos toda a tecnologia de um computador, então fica difícil você cativar um jovem que tá com o celular na mão pra ter outras vontades de conhecer", comenta Conversa.
Apesar disso, recentemente teve início um movimento de retomada, de redescoberta do radioamadorismo pelo público mais jovem. E isso se deve, em grande medida, pelas infinitas possibilidades que o radioamador possui, que envolvem experimentos, competições e até mesmo sua integração às tecnologias mais novas.
"Muita gente pensa que o radioamadorismo é coisa antiga, mas ele não é. Ele está bem implementado com as tecnologias atuais, você vai conseguir transmitir imagens, consegue falar daqui com o outro lado do mundo. Você integra o rádio com a tecnologia IP, com a informática, e você consegue trafegar informação, dado, imagem, pode utilizar satélite… Nós temos alguns países que lançam satélites com frequência específica para radioamador, seja para o próprio hobby, seja para a própria experimentação. É uma coisa bem diversificada", ressalta o supervisor do REER, destacando ainda o papel educativo do hobby.
"O radioamadorismo dá conhecimento de geografia para o jovem, conhecimento de língua, conhecimento de eletrônica, de física… Então tudo isso acaba sendo um hobby, uma espécie de atividade que te ajuda a abrir a mente também, principalmente naquela idade da adolescência do jovem, onde você abre a curiosidade e aí você simplesmente dá um pontapé inicial para ele prosseguir, no caso, se ele vai querer prosseguir no hobby ou aquilo vai ser também um patamar para ele conseguir outras coisas da vida dele profissionalmente".
"Quando parou tudo, quem poderá nos salvar? Então chame a REER Paraná"
Para além do hobby, o radioamadorismo também possui atuação fundamental em momentos de calamidade. No Paraná, por exemplo, existe desde 2002 a Rede Estadual de Emergência de Radiomadores (REER). Trata-se de uma rede formada especificamente por voluntários que são vinculados à Defesa Civil e que utilizam do seu hobby, o radiamadorismo, para poder apoiar os órgãos oficiais nas situações de emergência, ajudando a salvar vidas.
"Às vezes, por causa de uma tempestade, um vendaval ou alguma outra situação de calamidade, um local pode ficar sem comunicação. E sem comunicação, você diminui o tempo de resposta, que é fundamental para ajudar a salvar vidas. É aí que a REER entra para auxiliar as instituições do Estado e trazer essa informação mais rápido, para mover recursos. A REER em si era o telefone do Estado quando o Estado não conseguia ter mais a sua comunicação tradicional. Quando acabou tudo, parou tudo, quem poderá nos salvar? Então chame a REER Paraná. Deu até rima", brinca o supervisor da Rede.
Ao longo das décadas, a instituições já atuou em buscas de embarcações ou em cidades afetadas por vendavais ou tempestades, por exemplo. Mais recentemente, quando teve a queda de barreira na BR-376, os radioamadores também foram acionados.
"Quando caiu a barreira, ela levou poste, tirou alimentação da estação de celular. E as equipes de socorro estavam num fundo de vale, não tinham comunicação do local do deslizamento até cinco quilômetros pra cima. Mas precisa passar as informações pro quartel de Guaratuba ou São José dos Pinhais. Aí, qual o meio que atendeu eles? O rádio. O rádio também tem alimentação, mas aí a gente é flexível, pode montar um posto de apoio, de comando, aí tem um outro que fica mais avançado, aí a gente sobe e monta uma repetidora no alto do morro e você consegue fazer a linha de comunicação e chegar onde você precisa", explica Fábio Converso.
Ao todo, há cerca de 140 voluntários ativos na rede, atuando em 19 supervisões regionais em todo o Paraná. Para participar, é preciso ter pelo menos 18 anos de idade, ser um radioamador licenciado e preencher um cadastro da Defesa Civil. "Quem se cadastra é chamado para fazer reuniões, participar de atividades… E dependendo da participação, o próprio supervisor vai indicar ele para um curso e depois de fazer esse curso ele se torna oficialmente um voluntário da Defesa Civil, da REER", explica Fábio.
Dia nacional do radioamador
Em todo o país, o dia 5 de novembro marca o Dia do Radioamador Brasileiro, em celebração à publicação do Decreto nº 16.657 de 1924, que regulamentava as estações de radioamadores do Brasil. Até 1968, porém, a celebração acontecia em 22 de outubro, quando foi feita a primeira sessão da Assembleia Geral dos Radioamadores Paulistas e Cariocas, que fundiram suas entidades e criaram a LABRE – Liga de Amadores Brasileiros de Rádio Emissão. A fixação do 5 de novembro, por outro lado, aconteceu após meticuloso trabalho de pesquisa realizado pelo radioamador João Ramos Bacaratt (PY2AJ), que levou suas descobertas para o Conselho Federal da Labre, que em outubro de 1968 estava reunido em Curitiba e decidiu por alterar a data da celebração para 5/11, em homenagem ao referido decreto.
